entrelinhas...

".. uma das coisas que aprendi é que se deve viver apesar de. Apesar de, se deve comer. Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer. Inclusive muitas vezes é o próprio apesar de que nos empurra para a frente. Foi o apesar de que me deu uma angústia que insatisfeita foi a criadora de minha própria vida..."
Clarice Lispector

Um lugar incomum..

"Viver é ser outro,nem sentir é possível,se hoje se sente como ontem se sentiu,sentir hoje o mesmo que ontem não é sentir;é lembrar hoje o que se sentiu ontem,ser hoje o cadáver vivido do que ontem foi a vida perdida."
Fernando Pessoa.

domingo, 7 de setembro de 2014

Dor[M]ir

(...)
Esse sono
Parecerá aos outros o sono de dormir,
O sono da vontade de dormir,
O sono de ser sono.

Mas é mais, mais de dentro, mais de cima:
E o sono da soma de todas as desilusões,
É o sono da síntese de todas as desesperanças,
É o sono de haver mundo comigo lá dentro
Sem que eu houvesse contribuído em nada para isso.

O sono que desce sobre mim
É contudo como todos os sonos.
O cansaço tem ao menos brandura,
O abatimento tem ao menos sossego,
A rendição é ao menos o fim do esforço,
O fim é ao menos o já não haver que esperar.

                           (...)
                                                                                      Fernando Pessoa 

Como invejo o sono , ele nos afasta do mundo e nos direciona para onde queremos, ou para onde precisamos ir , através dele é possível sonhar...

No sono eu descanso o meu corpo...
No sonho eu descanso meu espirito ..
No sono eu esqueço das minhas dores..
No sonho eu consigo cura- las ...

Talvez por que quando eu sonho eu não sou eu..
 Mais ainda sim , no meu sono eu não te amo,
 Mais quando eu sonho eu tenho você,
 No meu sono eu também não te tenho ,
 mais quando eu sonho você me vê...

Eu quero acordar e pode dizer quantas vezes eu sonhei com você, quantas vezes eu tentei te esquecer, quantas vezes eu torci para o acaso me buscar, me pegar no colo, me testar...
Hoje; e só hoje, eu entendo que quanto mais bonito o sonho, mais forte a dor de acordar, e como dói esse dia que segue os dias que você não está...
Então te tranquei no meu sonho sem me arrepender, com medo de você fugir, mais o que farei ao descobrir que você nunca existiu...

Tudo que eu gostaria era dor[M]ir...

terça-feira, 22 de julho de 2014

O Mundo não se Fez para Pensarmos Nele



O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de, vez em quando olhando para trás...
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem...

Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo...

Creio no mundo como num malmequer,
Porque o vejo.Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender ...



O Mundo não se fez para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...




Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que é amar ...
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência não pensar...

Alberto Caeiro

quarta-feira, 21 de maio de 2014

"Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer, amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?
Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,

é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?
Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho,
e uma ave de rapina.
Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor à procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.
Amar a nossa falta mesma de amor,
e na secura nossa, amar a água implícita,
e o beijo tácito, e a sede infinita."

(Carlos Drummond de Andrade)


Olho para o meu lar, observo as loucuras tão silentes que se deitam ao meu lado tão discretas, que passam quase a não existir , se não fossem as memorias e os gritos sinceros que disparam nos pequenos detalhes, não lembraria mais da minha solidão.
Mas acordo diferente , olho defronte das minhas limitações que se não fossem tão forte me fariam infeliz, como pode viver um super herói, sem medo?
Me pergunto sobre o valor do que vivemos sem o pesar e o receio do erro....
Quantos foram os tais ?
E quando os quantos tais se foram ?
Se foram ?
 E se fossem?  levariam tudo que tinha , tudo que me foi dado , e tudo que roubei de outros tantos, e quantos são ?! Não sei .
Esses marcapassos do destino que me faz cair nas mesmas duvidas que já não interessam mais aos meus amores.
Amei.
E aprendi que o permanente é um status de pobreza de alma , de comodismos das próprias opções que ignoramos, da certeza, que é tão miserável e tortuosa quanto a duvida, por que peca em seu principio e falha.
Das minhas mentiras sobraram aquilo que não declarei , e daquilo que por desleixo se fez verdadeiro; não procuro mais a chance , nem recupero esforços, agora sei que se foi , e convivo melhor com a perca daquilo que nunca ousou ser meu.
Conheço o meu abrigo e mesmo que ele esteja invadido de teóricas decisões ainda é lugar mais seguro; pela legitimidade.
Estou educando minha sobrevivência, para que ela possa perceber , que a liberdade não tem dono, nem moradia,isso inclui os cosmos , as estrelas e  os cardiopatas  e os amantes.

domingo, 23 de março de 2014

‘Arte de Amar’, de Manuel Bandeira
“Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a tua alma.
A alma é que estraga o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus - ou fora do mundo.
As almas são incomunicáveis.
Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.
Porque os corpos se entendem, mas as almas não.”

Basta.